18 de dezembro de 2017

Cristão pode celebrar o natal?


Uma polêmica que volta à tona a cada fim de ano é se o cristão pode celebrar o natal. Os que são contra a prática alegam que ela tem origem pagã, e, portanto, deve ser proibida para o cristão. O que sustentarei neste artigo é que celebrar o natal não é nenhum pecado e deve ser uma opção livre de cada cristão, e que o “argumento do paganismo” não é forte o bastante aqui. Isso porque é preciso distinguir entre coisas que provém do paganismo e que são pecado, e coisas que provém do paganismo mas que não são pecaminosas e que, em muitos casos, são até úteis e praticadas por qualquer um desses que condenam a celebração do natal. Abaixo segue alguns exemplos (a maioria deles disponível na página Defensores do Evangelho, por Zilton Alencar):

• O bolo tem origem pagã, e remonta os cultos à deusa Ártemis (a mesma deusa Diana citada em Atos 19:24). Os primeiros tipos de bolo eram feitos com farinha e mel e oferecidos a esta deusa como oferendas.

• O vestido branco de casamento tem origem nas vestes usadas nos sacrifícios humanos dos cultos pagãos, onde uma vítima teria que ser sacrificada aos deuses: uma virgem, que deveria usar uma roupa de cor branca que apontava para a condição de sua virgindade.

• As alianças não só têm origem pagã, como o seu uso no dedo anular da mão esquerda também é costume pagão e supersticioso: a tradição do paganismo afirma que elas devem forçosamente ser colocadas neste dedo, pois há uma veia que passa exatamente nele, e que desemboca diretamente no coração. Esta “informação” é desmentida pela anatomia.

• O ato da noiva jogar o buquê ao término da cerimônia também vêm do paganismo: a moça que o pegar será a próxima a se casar. Este costume, embora claramente supersticioso, nunca foi condenado nem abolido de nosso meio.

• A troca de cálices no brinde entre os noivos também é costume pagão, assim como o ato de o noivo dar de comer à noiva um pedaço de bolo, e vice-versa. Este costume tem suas origens nas alianças primitivas, e foi perpetuado no nosso tempo através da cultura pagã cigana.

• O ato de se jogar arroz na saída dos noivos também faz parte da tradição pagã. Os chineses praticam esta tradição há milênios em suas cerimônias de casamento, e estão declarando ao fazê-lo: “Os deuses te abençoem, jamais deixando faltar arroz em tua panela” (o arroz é a base da alimentação do povo chinês).

• Enquanto argumenta-se que a ceia e os presentes no natal são pecado, ambos são feitos nos casamentos sem qualquer constrangimento. Inclusive, listas de presentes são estrategicamente deixadas em lojas da cidade, para "obrigar" os convidados a comprar presentes caros. Se cristão não pode celebrar o natal, então muito menos deveria celebrar casamentos.

• A ornamentação da igreja e do salão de recepções inclui muitas coisas de origem pagã (estatuetas no bolo, lembrancinhas, etc). Além disto, muitos elementos do cerimonial foram originados das cerimônias católicas (marcha nupcial, a forma da entrada de noivos e padrinhos, etc).

• Ao se chegar em casa, ou na suíte nupcial, o noivo carrega a noiva no colo, romanticamente. Mas este ato era um ritual romano, que simbolizava não só a "posse" da mulher pelo marido (propriedade mesmo!), mas também o fim do culto dos deuses da família da noiva, que passaria a adotar os deuses do marido.

• De origem totalmente pagã, a medicina tem como símbolo o Bordão de Esculápio, relacionado à astrologia e que representa um deus pagão egípcio, até hoje patrono da medicina. Da mesma forma, o crente que não celebra o natal por ter origem pagã também não poderia fazer uso da medicina, que também é pagã. Eles devem contar apenas com o poder da oração e da fé.

• Outro detalhe pagão ligado à medicina é a farmácia, estabelecimento para onde somos imediatamente encaminhados apos a consulta médica. Este nome tem origem na palavra grega φαρμακεια (pharmakeia), que no NT é traduzida como feitiçaria (Gl 5:20). Portanto, se demônios são adorados de forma inconsciente ao se armar uma árvore de natal, também o são quando vamos a um médico ou farmácia, já que a origem de ambos é pagã.

• Quem estudar sobre as origens das enfermeiras saberá que as primeiras profissionais da área foram recrutadas entre as prostitutas, mas nem por isso ser enfermeira é pecado.

• A prática esportiva teve início remoto. Já havia monumentos de vários estilos esportivos dos antigos egípcios, babilônios e assírios com cenas de luta, jogos de bola, natação, acrobacias e danças. Os próprios Jogos Olímpicos foram criados na Grécia, mas nem por isso é pecado praticar esportes.

• A hermenêutica, estudada na teologia e no direito, também tem origem pagã, pois vem do "deus" Hermes, o intérprete dos "oráculos divinos", mas nem por isso é pecado estudar essa disciplina.

• A filosofia vem dos gregos de antes de Cristo, mas nem por isso ser filósofo ou estudar filosofia é pecado.

• Os dias da semana em inglês são referências a deuses pagãos (por exemplo, Thursday, que significa “dia de Thor”), mas nem por isso um inglês ou americano está em pecado por chamar os dias da semana da mesma que conhece.

• Quando os pianos surgiram, eram usados em cabarés, mas nem por isso ter ou tocar piano é pecado.

• As universidades foram criadas pelos árabes (muçulmanos), sendo a primeira delas a Universidade al Quaraouiyine, do Marrocos, fundada em 859, mas nem por isso entrar numa universidade é pecado.

• Várias ciências (como a alquimia, que deu origem à química) foram criadas pelos árabes, mas nem por isso estudar essas ciências é pecado.

• Os árabes também inventaram a álgebra, mas nem por isso usar a álgebra ou aprendê-la na escola e ensiná-la aos outros é pecado.

• Os chineses inventaram o papel, mas nem por isso usar papel é pecado.

Da mesma forma, por mais que o natal tenha origem pagã, nem por isso significa que o cristão não pode celebrar o natal.

Alguém poderá contestar aqui: significa então que devemos aceitar numa boa qualquer invenção pagã? É óbvio que não é isso o que está sendo dito, porque é preciso distinguir o paganismo tolerável do intolerável. Os pontos acima, e outros milhares que poderiam ser acrescentados e que envolveriam muita coisa do que você faz no cotidiano, fazem parte do paganismo tolerável, porque não envolvem doutrina ou moral. Ou seja, o que vêm do paganismo e deve ser rejeitado diz respeito ao acréscimo de doutrinas antibíblicas ou de coisas imorais que nos conduzem ao pecado e para longe de Deus (por exemplo, uma falsa doutrina sem base bíblica que é introduzida para dentro da doutrina de alguma igreja, ou alguma prática pagã imoral e carnal para satisfazer os desejos impuros da carne).

Nós não devemos ser ingênuos a ponto de só praticar aquilo que foi inventado por cristãos, porque há milhares de anos antes do Cristianismo existir já havia um mundo muito vivo lá fora, um mundo “pagão”, mas que contribuiu em grande parte para o desenvolvimento da civilização, e não devemos ser prepotentes e arrogantes a ponto de descartar e desprezar tudo o que foi feito pelos pagãos como se fosse tudo ruim ou inaceitável. Por outro lado, devemos rechaçar com todas as forças tudo aquilo que nos leva ao pecado, ou seja, o que diz respeito a doutrina ou moral antibíblica, não apenas do que tenha procedência pagã, mas até mesmo do que foi inventado por cristãos sem base bíblica.

Isso implica que, desde que algo não nos conduza a novas doutrinas ou a práticas imorais, não há problema com isso, independentemente se é uma criação original de povos pagãos ou cristãos. E é claro que o natal não diz respeito a práticas imorais pecaminosas e nem a uma nova doutrina, mas apenas a um costume moralmente aceitável, que é praticado por muita gente. Ou seja, não é a origem das coisas que deve ser priorizada, mas sim seu conteúdo. Há coisas de origem “cristã” que são repudiáveis (ex: falsas doutrinas, como a teologia da prosperidade, que nasceu em seio cristão), e da mesma forma há coisas de origem pagã (ex: o casamento) que são totalmente toleráveis. Por isso é errado colocar tudo na mesma “caixinha” do paganismo, e rejeitar tudo a priori.

O que os cristãos fazem no natal? Reúnem a família, se confraternizam, trocam presentes, celebram o nascimento do menino Jesus. Nada disso é algo imoral ou uma falsa doutrina. São práticas que seriam tidas como perfeitamente normais e aceitáveis se não fosse pela acusação de “origem pagã” – e neste caso, teriam também que repudiar todos os outros pontos da lista que passamos aqui. Há quem possa alegar que está errado mesmo assim, porque não foi neste dia que Jesus nasceu. O problema é que ninguém sabe o dia exato do nascimento de Jesus, então escolhermos um dia do calendário para celebrar algo tão importante como a vinda do Redentor do mundo é algo perfeitamente aceitável, ainda que não seja no dia exato em questão. Quando Deus lá de cima olha as pessoas celebrando o nascimento de Seu filho, ele não fica irado por estarem celebrando no “dia errado” por não saberem o dia específico, pois conhece a intenção de cada coração, que é boa.

Quando os cristãos se reúnem para celebrar o natal, estamos conscientes de que não estamos “adorando um deus pagão” ou “celebrando o Papai Noel”, mas sim que estamos rendendo honra e glória ao Senhor Jesus. Desde que essa seja a intenção e o propósito no coração de cada cristão que assiste a uma peça natalina, ou que troca presentes com parentes e amigos, ou que se reúne com eles em confraternização e comunhão, não há em absoluto qualquer pecado ou transgressão às leis de Deus. Nenhum cristão estará “adorando um deus pagão inconscientemente” por falar de Jesus em 25 de dezembro. Em vez disso, é uma ótima oportunidade de falar ao mundo sobre o verdadeiro sentido do natal, de modo a fazê-los olhar para Aquele que um dia se fez carne, veio ao mundo e se tornou um de nós para nos salvar. Que aproveitemos essa preciosa oportunidade, em vez de nos metermos em incansáveis discussões sobre se o cristão pode celebrar o natal. 

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Por Cristo e por Seu Reino,

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2 comentários:

  1. É quanto à Páscoa que celebramos todo ano, que pensas?

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    Respostas
    1. O dia da páscoa é provado biblicamente, sabemos quando os judeus comemoravam a solenidade e consequentemente sabemos também em que dia Jesus morreu e ressuscitou (não é como no natal, que ninguém sabe ao certo em que dia Jesus nasceu e por convenção social definiu-se esse dia para comemoração). Ou seja, a páscoa é inteiramente "certinha", até no dia em que a celebramos, enquanto o natal pode ser celebrado (como mostro no artigo) mas com a consciência de que a data correta não é aquela.

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