30 de julho de 2014

Comentários de Lucas 12

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Este capítulo faz parte da obra: “O Novo Testamento Comentado”, de autoria de Lucas Banzoli e de livre divulgação.
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1. Juntando-se, entretanto, muitos milhares da multidão, tanto que se atropelavam uns aos outros, começou a dizer primeiramente a seus discípulos:
Guardai-vos do fermento dos fariseus, que é hipocrisia.
2. E nada há encoberto que não haja de ser descoberto; nem oculto que não haja de ser sabido.
3. Portanto tudo o que dissestes nas trevas, será ouvido na luz; e o que falastes ao ouvido nos quartos, será pregado sobre os telhados.
4. E digo-vos, amigos meus, não temais aos que matam o corpo, e depois não têm mais o que possam fazer.
5. Mas eu vos mostrarei a quem deveis temer; temei a aquele, que depois de matar, [também] tem poder para lançar no inferno; sim, a este temei.
6. Não se vendem cinco passarinhos por duas pequenas moedas? E nem um deles está esquecido diante de Deus.
7. E até os cabelos de vossa cabeça estão todos contados; não temais, pois; mais valeis vós que muitos passarinhos.
8. E vos digo que todo aquele que me confessar diante dos seres humanos, também o Filho do homem o confessará diante dos anjos de Deus.
9. Mas quem me negar diante dos seres humanos será negado diante dos anjos de Deus.
10. E a todo aquele que disser [alguma] palavra contra o Filho do homem, lhe será perdoado, mas ao que blasfemar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado.
11. E quando vos trouxerem às sinagogas, aos magistrados e autoridades, não estejais ansiosos, como, ou que, em [vossa] defesa deveis dizer, ou que deveis falar.
12. Porque na mesma hora o Espírito Santo vos ensinará o que deveis falar.
13. E um da multidão lhe disse:
Mestre, dize a meu irmão que reparta a herança comigo.
14. Mas ele lhe disse:
Homem, quem me pôs por juiz, ou repartidor sobre vós?
15. E disse-lhes:
Olhai, e tomai cuidado com a ganância; porque a vida de alguém não consiste na abundância dos bens que possui.
16. E propôs-lhes uma parábola, dizendo:
A terra de um homem rico tinha frutificado bem.
17. E ele questionava a si mesmo, dizendo:
Que farei? Porque não tenho onde juntar meus frutos.
18. E disse:
Farei isto: derrubarei meus celeiros, e construirei maiores, e ali juntarei toda esta minha colheita, e estes meus bens.
19. E direi à minha alma: 
Alma, muitos bens tens guardados, para muitos anos; descansa, come, bebe, alegra-te!
20. Porém Deus lhe disse:
Louco, esta noite te pedirão tua alma; e o que tens preparado, de quem será?
21. Assim [é] o que junta tesouros para si, mas não é rico em Deus.
22. E disse a seus discípulos: 
Portanto vos digo, não estejais ansiosos por vossa vida, que comereis; nem pelo corpo, que vestireis.
23. Mais é a vida que o alimento, e [mais] o corpo que o vestido.
24. Considerai os corvos, que nem semeiam, nem ceifam; nem tem armazém, nem celeiro; e Deus os alimenta.
25. E quem de vós pode, com sua ansiedade, acrescentar um côvado à sua altura?
26. Pois, se não podeis nem mesmo com algo pequeno, por que estais ansiosos com o resto?
27. Considerai os lírios, como crescem; não trabalham, nem fiam; e digo-vos, que nem mesmo Salomão, em toda sua glória, [chegou] a se vestir como um deles.
28. E se assim Deus veste a erva, que hoje está no campo, e amanhá é lançada no forno, quanto mais [vestirá] a vós, homens de pouca fé?
29. Vós, pois, não pergunteis que comereis, ou que bebereis; e não andeis preocupados.
30. Porque todas estas coisas, os gentios do mundo as buscam; mas vosso Pai sabe que necessitais destas coisas.
31. Mas buscai o Reino de Deus, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.
32. Não temas, ó pequeno rebanho; porque vosso Pai se agradou de dar a vós o Reino.
33. Vendei o que tendes, e daí esmola. Fazei para vós bolsas que não se envelheçam; tesouro nos céus que nunca se deprecia; onde ladrão não chega, nem a traça destrói.
34. Porque aonde estiver vosso tesouro, ali estará também vosso coração.
35. Estejam devidamente vestidos vossos quadris, e acesas as lâmpadas.
36. E sede vós semelhantes às pessoas que esperam a seu senhor quando voltar do casamento; para que quando ele vier, e bater, logo possam lhe abrir.
37. Bem-aventurados aqueles servos, os quais, quando o Senhor vier, [os] achar vigiando; em verdade vos digo que ele se vestirá, e os fará se sentarem [à mesa], e chegando-se, os servirá.
38. E ainda que venha à segunda vigília; e [que] venha a terceira vigília, e assim [os] achar, bem-aventurados são tais servos.
39. Isto, porém, sabei: que se o chefe da casa soubesse à que hora o ladrão viria, ele vigiaria, e não deixaria sua casa sofrer dano.
40. Vós, pois, também estejais prontos; porque o Filho do homem virá à hora que não imaginais.
41. E Pedro lhe disse:
Senhor, dizes tu esta parábola para nós, ou também para todos?
42. E o Senhor disse:
Qual é, pois, o mordomo fiel e prudente, a quem [seu] senhor puser sobre seus servos, para que [lhes] dê alimento no tempo certo?
43. Bem-aventurado aquele servo ao qual, quando seu senhor vier, o achar fazendo assim.
44. Em verdade vos digo, que o porá sobre todos os seus bens.
45. Mas se aquele servo disser em seu coração:
Meu senhor está demorando para vir; 
e começar a espancar aos servos e servas, e a comer, e a beber, e a se embebedar,
46. Virá o senhor daquele servo, no dia em que ele não espera, e na hora que ele não sabe; e será partido em dois, e porá sua porção com os incrédulos.
47. E o servo que sabia a vontade de seu senhor, e não se preparou, nem fez conforme a sua vontade, será muito espancado.
48. Mas o que não sabia, e fez [coisas] dignas de pancadas, será pouco espancado. E a qualquer que muito for dado, muito se lhe pedirá, e ao que muito se confiou, muito mais lhe será exigido.
49. Eu vim para lançar fogo na terra; e o que mais posso querer, se já está aceso?
50. Porém há um batismo que tenho que ser batizado; e como me angustio até que se venha a cumprir!
51. Vós pensais que vim para dar paz à terra? Não, eu vos digo; mas antes [vim para trazer] divisão.
52. Porque daqui em diante cinco estarão divididos em uma casa; três contra dois, e dois contra três.
53. O pai estará dividido contra o filho, e o filho contra o pai; a mãe contra a filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra sua nora, e a nora contra sua sogra.
54. E ele dizia também para as multidões:
Quando vedes a nuvem que vem do ocidente, logo dizeis:
Lá vem chuva;
E assim acontece.
55. E quando venta do sul, dizeis:
Haverá calor;
E assim acontece.
56. Hipócritas! Sabeis entender a aparência da terra e do céu; e como não entendeis este tempo?
57. E por que também não julgais por vós mesmos o que é justo?
58. Pois quando fores com teu adversário à autoridade, procura te livrares dele no caminho, para que ele não venha a te levar ao juiz, e o juiz te entregue ao oficial de justiça, e o oficial de justiça te lance na prisão. 
59. Eu te digo que não sairás dali enquanto não pagares até a última moeda.



12.1 fermento. V. nota em 1Co.5:6.

12.2 não há nada encoberto que não haja de ser descoberto. V. nota em Lc.8:17.

12.4 matam o corpo, e depois não têm mais o que possam fazer. Originalmente, Jesus havia dito que “não podem matar a alma” (v. nota em Mt.10:28), mas aqui Lucas escrevia a leitores gregos, que tinham em mente uma concepção equivocada do significado de alma (psiquê), crendo no sentido platônico de uma entidade imaterial que possuímos interiormente e que nos garante imortalidade incondicional. Tal conceito era diametralmente oposto à concepção hebraica original do termo, onde alma-nephesh nada mais era senão o ser vivo que o homem se tornou após a união do barro com o fôlego de vida (Gn.2:7), e em sentido figurado e secundário representava as emoções, vontades e intelecto do homem, cujos pensamentos perecem na morte (Sl.146:4). Para evitar esta confusão, Lucas retira o termo “alma” da frase e em seu lugar vai direto aosignificado da frase dita por Cristo, que em nada tinha a ver com uma alma imortal. O sentido é de que os homens podem matar o corpo (dar um fim à existência terrestre), mas não podem lançar no geena (a condenação que sucede a ressurreição), enquanto Deus pode destruir a existência terrena e lançar os pecadores impenitentes no geena (sobre o significado de geena, v. nota em Mc.9:44, em Mt.5:26 e em Lc.12:47-48).

12.8 confessar diante dos seres humanos. V. nota em Mt.10:32-33.

12.10 blasfemar contra o Espírito Santo. Ao que tudo indica, a blasfêmia contra o Espírito Santo não é um ato isolado ou um tipo específico de pecado, mas é o estado no qual um pecador se encontra onde não pode mais voltar à salvação (Mc.3:29), não porque seu arrependimento não seja considerado, uma vez que todo aquele que se arrepende é salvo (At.3:19), mas porque seu coração está tão duro e tão fechado para o evangelho que já não pode mais arrepender-se. Deus é longânimo para com os pecadores (2Pe.3:9) e os espera por muito tempo (v. nota em Ap.2:21), mas se o indivíduo rejeita continuamente as oportunidades dadas por ele é “entregue” ao pecado (Rm.1:28; v. nota em 1Ts.2:16), no sentido de que Deus não vai fazer mais derramar sua graça preveniente sobre o individuo, o que possibilitaria que este deixasse o estado de morte espiritual para o estado de vida. Consequentemente, este indivíduo caído não poderá arrepender-se e crer, ainda que uma vez tenha crido. É sobre este estado, que podemos chamar de “fundo do poço”, que o autor de Hebreus se refere em Hb.6:4-6 (v. nota), e que João considera “pecado mortal”, o qual ele recomenda que não oremos pelo pecador, pelo fato do mesmo já estar condenado (v. 1Jo.5:16 e nota). Antes que alguém se preocupe na dúvida se já caiu em tal condição, cabe ressaltar que neste estado o homem não sente nenhum mal em pecar deliberadamente, e não tem qualquer apreço ou consideração pelas coisas de Deus, nem nenhum desejo de fugir da condição de pecado. Portanto, o próprio fato de alguém ainda sentir alguma tristeza ou arrependimento pelos pecados já é sinal de que ele não blasfemou contra o Espírito Santo, e que ainda não chegou neste estado irreversível de depravação. Tal pessoa ainda está dentro da longanimidade de Deus e ainda pode aceitar a graça preveniente para a salvação, embora as oportunidades estejam se esgotando com o tempo (v. nota em Lc.13:6-9).

12.13 dize a meu irmão que reparta a herança comigo. Ao que tudo indica, aquele homem estava preocupado apenas com os bens materiais. É digno de nota que na única vez em que Jesus foi inquirido sobre posses terrenas e colocado em meio a tudo isso ele repudiou tal atitude e sequer lhe deu resposta quanto ao pedido; mas, ao contrário, respondeu dizendo que não iria se meter em tais assuntos (v.14). Muitas igrejas anunciam prosperidade e bens materiais em seus púlpitos, e usam o nome de Jesus para invocar as bênçãos terrenas, da mesma forma que aquele homem estava querendo que Cristo se colocasse como “advogado” dele em uma questão material, intermediando em seu favor. Jesus não está preocupado se um indivíduo tem o carro do ano, a casa própria, se é “próspero” ou se terá a herança que foi tomada pelo irmão (v.13), mas está preocupado com a vida espiritual da pessoa, com o pecado, com as tentações, com a salvação, com a vida eterna.

12.30 porque todas estas coisas, os gentios do mundo as buscam. Aquele que coloca em primeiro lugar as coisas terrenas estará se assemelhando ao pagão. Nós não temos que nos preocupar com aquilo que é terreno, mas confiar na provisão de Deus, que nunca nos deixará, nem nos abandonará (Hb.13:5). Ele nos garantirá o necessário e o básico no que se refere a alimentos e roupas (v.22). Cabe a nós buscarmos o Reino de Deus em primeiro lugar (v.31), e estas coisas nos serão dadas por ele (v.31, v. nota em Mt.6:33). Obviamente, esta provisão divina não irá cair do Céu, mas vem por meio do trabalho (2Ts.3:10). O que Cristo rejeita não é o trabalho em si, mas a preocupação com o trabalho, como se fosse o mais importante, ou como se tudo dependesse somente do trabalho em si, e não de Deus em providenciar o sustento através do trabalho.

12.33 vendei o que tendes, e daí esmola. A lógica do Reino não é a de acumular para enriquecer, mas sim a de se desfazer do que tem a mais, para ajudar o que tem a menos.

12.34 onde estiver vosso tesouro, ali estará também vosso coração. Se o tesouro está na terra (riquezas), o coração também está (longe de Deus). Se o tesouro está no Céu (boas obras), nosso coração também ali está (perto de Deus). O que Jesus ensina é que não é possível as duas coisas conviverem juntas, com o coração focado na terra e no Céu, ao mesmo tempo perto e longe de Deus. Em um contexto semelhante a este, ele diz que é impossível servir a dois senhores (Mt.6:24).

12.35 NVI: “Estejam prontos para servir, e conservem acesas as suas candeias”. acesas vossas lâmpadas. I.e, em estado de vigilância espiritual, atento contra todas as obras do mal, pronto para resistir a qualquer tentação.

12.38 segunda vigília. I.e, “de noite”. Terceira vigília. I.e, “de madrugada”. O ensino é de que devemos estar preparados o tempo todo.

12.40 hora que não imaginais. V. nota em Mt.24:36.

12.47-48 muito espancado... pouco espancado. Lit.: “muitos açoites... poucos açoites”. Isso testemunha fortemente contra a tese de que o tormento no inferno será eterno. Jesus em momento nenhum diz que haverá alguém que será espancado eternamente, que receberá açoites para sempre. Ele, ao contrário, fala de pessoas que receberão muitos açoites, e de outras que receberão poucos açoites. Se alguém receberá “poucos” açoites significa, obviamente, que esse castigo não será eterno, pois o “pouco” presume um fim, ou senão não seria “pouco”. Um período eterno que dura pouco seria a maior incoerência lógica e filosófica que poderia existir; de fato, é uma contradição de termos. Logicamente, Cristo estabelece aqui não uma punição indiscriminada a todos os pecadores, como um tormento eterno para todos, mas um castigo que é proporcionalaos pecados cometidos por cada um. Uns levarão muitos açoites no geena, e outros levarão poucos açoites. Um índio de 12 anos que morreu em pecado sem conhecer Jesus não ficará queimando pelo mesmo tempo (eternamente) que Adolf Hitler, um genocida sanguinário responsável pela tortura e assassinato de milhões de inocentes. No geena, todos cumprem um tempo relativo e proporcional aos seus delitos, “até pagar o último centavo” (v. nota em Mt.5:26), e não “para sempre”. A morte final (lago de fogo) coloca um fim aos tormentos, para que apenas os salvos herdem uma existência eterna (imortalidade), em conformidade com Rm.2:7 (v. nota).

12.48 muito for dado, muito se lhe pedirá. V. nota em Mt.10:15.

12.49 lançar fogo. Figura do juízo divino (1Co.3:13). já está aceso. A vinda de Jesus é o início do julgamento para aqueles que o aceitaram ou o rejeitaram enquanto ele esteve entre nós. Na ressurreição haverá o juízo final, onde tudo o que está encoberto será descoberto, e onde tudo o que está em oculto será revelado (Mc.4:22), e as obras de cada um serão colocadas à prova (v. nota em 1Co.3:13). Neste dia o juízo será consumado e cada um receberá de Deus a sua aprovação ou reprovação (1Co.4:5).

12.50 batismo que tenho que ser batizado. V. nota em Mt.20:22.

12.51 vim para trazer divisão. V. nota em Mt.10:34.

12.56 como não entendeis este tempo? O tempo anunciado pelos profetas na Escritura, que remetia a Cristo como o Messias. Eles sabiam discernir as coisas menos importantes, mas não aquilo que mais importava.

12.57 julgais. V. nota em Mt.7:1.

12.59 não sairás dali enquanto não pagares até a última moeda. V. nota em Mt.5:26.

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