18 de outubro de 2015

Comentários de Atos 7

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Este capítulo faz parte da obra: “O Novo Testamento Comentado”, de autoria de Lucas Banzoli e de livre divulgação.
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1 E disse o chefe dos sacerdotes: Essas coisas são assim [mesmo]?
2 E ele disse: Homens irmãos e pais, ouvi: o Deus da glória apareceu a nosso pai Abraão, estando ele na Mesopotâmia, antes de habitar em Harã;
3 E disse-lhe: Sai de tua terra, e de tua parentela, e vem a terra que eu te mostrarei.
4 Então ele saiu da terra dos caldeus, [e] habitou em Harã. E dali, depois que morreu seu pai, ele partiu para esta terra, em que agora vós habitais.
5 E [Deus] não lhe deu herança nela, nem mesmo a pegada de um pé; mas prometeu que a daria a ele em propriedade, e a sua semente depois dele, não tendo ele filho [ainda].
6 E Deus falou assim: Tua semente será peregrina em terra alheia, e a escravizarão, e a maltratarão [por] quatrocentos anos.
7 E à nação a quem eles servirem, eu a julgarei, (disse Deus). E depois disso eles sairão, e me servirão neste lugar.
8 E ele lhe deu o pacto da circuncisão; e assim gerou a Isaque, e o circuncidou ao oitavo dia; e Isaque [gerou] a Jacó, e Jacó aos doze patriarcas.
9 E os patriarcas, tendo inveja [de] José, venderam [-no] ao Egito; mas Deus era com ele.
10 E o livrou de todas as suas aflições, e lhe deu graça e sabedoria diante de Faraó, rei do Egito; e o pôs [por] governador sobre o Egito, e toda a sua casa.
11 E veio fome sobre toda a terra do Egito e de Canaã, e grande aflição; e nossos pais não achavam alimentos.
12 Mas Jacó, ao ouvir que havia cereal no Egito, ele enviou nossos pais a primeira vez.
13 E na segunda [vez], José foi reconhecido pelos seus irmãos, e a família de José foi conhecia por Faraó.
14 E José mandou chamar a seu pai Jacó, e toda a sua parentela, setenta e cinco almas.
15 E Jacó desceu ao Egito, e morreu; ele, e nossos pais;
16 E foram levados a Siquém, e postos na sepultura que Abraão, por uma quantia em dinheiro, tinha comprado dos filhos de Emor, [pai] de Siquém.
17 Mas quando chegou perto o tempo da promessa que Deus tinha prometido a Abraão, o povo cresceu e se multiplicou no Egito.
18 Até que se levantou outro rei, que não tinha conhecido a José.
19 Este, usando de astúcia para com nossa parentela, maltratou a nossos pais, até fazendo com que eles rejeitassem suas crianças, para que não sobrevivessem.
20 Naquele tempo nasceu Moisés, e ele era muito formoso para Deus, e ele foi criado por três meses na casa de seu pai.
21 E tendo sido abandonado, a filha de Faraó o tomou, e o criou para si como filho.
22 E Moisés foi instruído em toda a sabedoria dos egípcios; e era poderoso em palavras e ações.
23 E quando lhe foi completado o tempo de quarenta anos [de idade], veio ao seu coração [o desejo] de visitar a seus irmãos, os filhos de Israel.
24 E vendo um [deles] sofrendo injustamente, defendeu [-o], e vingou pelo que tinha sido oprimido, matando ao egípcio.
25 E ele pensava que seus irmãos tivessem entendido que Deus ia lhes dar liberdade por meio da mão dele; mas eles não entenderam.
26 E no dia seguinte, estando [uns deles] lutando, ele foi visto por eles, e ordenou-lhes [fazerem] as pazes, dizendo: Homens, vós sois irmãos, por que fazeis mal um ao outro?
27 Mas aquele que maltratava a seu próximo empurrou-o, dizendo: Quem te pôs por chefe e juiz sobre nós?
28 Queres tu [também] matar a mim, assim como ontem mataste ao egípcio?
29 E com esta palavra Moisés fugiu, e foi peregrino na terra de Midiã, onde ele gerou dois filhos.
30 E completados quarenta anos, um anjo do Senhor lhe apareceu no deserto do monte Sinai, em uma sarça inflamada.
31 Moisés, ao ver [isso], maravilhou-se da visão; e ao aproximar-se para ver, veio até ele a voz do Senhor,
32 Dizendo: Eu [sou] o Deus de teus pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó. E Moisés, estando tremendo, não ousava olhar com atenção.
33 E o Senhor lhe disse: Descalça-te as sandálias de teus pés, porque o lugar em que estás é terra santa.
34 Eu tenho visto com atenção a aflição de meu povo que [está] no Egito, e ouvi o gemido deles, e eu desci para livrá-los; então vem agora, eu te enviarei ao Egito.
35 A este Moisés, ao qual tinham negado, dizendo: Quem te pôs por chefe e juiz, A este Deus enviou por chefe e libertador, pela mão do anjo que lhe apareceu na sarça.
36 Este os levou para fora, fazendo milagres e sinais na terra do Egito, e no mar Vermelho, e no deserto, [por] quarenta anos.
37 Este é o Moisés que disse aos filhos de Israel: O Senhor, vosso Deus, vos levantará um profeta dentre vossos irmãos, como a mim; a ele ouvireis.
38 Este é aquele que esteve na congregação [do povo] no deserto com o anjo que tinha lhe falado no monte Sinai, e [com] nossos pais; o qual recebeu as palavras vivas, para dar a nós;
39 Ao qual nossos pais não quiseram obedecer; mas [o] rejeitaram, e seus corações voltaram ao Egito;
40 Ao dizerem a Arão: Faz-nos deuses, que irão adiante de nós; porque [quanto a] este Moisés, que nos levou para fora da terra do Egito, nós não sabemos o que aconteceu com ele.
41 E naqueles dias eles fizeram o bezerro, o ofereceram sacrifício ao ídolo, e se alegraram nas obras de suas [próprias] mãos.
42 E Deus se virou [contra eles], e os entregou, para que servissem ao exército do céu, assim como está escrito no livro dos profetas: Por acaso, casa de Israel, vós oferecestes a mim animais mortos, e sacrifícios no deserto [por] quarenta anos?
43 Mas tomastes [para si] a tenda de Moloque, e a estrela de vosso Deus Renfã, figuras que vós fizeste para adorá-las; e eu [por isso] vos expulsarei para além da Babilônia.
44 No deserto estava entre nossos pais o Tabernáculo do testemunho, assim como ele tinha ordenado, falando a Moisés, que o fizesse segundo o modelo que tinha visto.
45 O qual, recebendo [-o] também nossos Pais, eles levaram com Josué para a possessão dos gentios que Deus expulsou diante de nossos Pais, até os dias de Davi;
46 O qual foi do agrado diante de Deus, e pediu para achar um tabernáculo para o Deus de Jacó.
47 E Salomão lhe construiu uma casa.
48 Mas o Altíssimo não habita em templos feitos por mãos, assim como o profeta diz:
49 O céu é o meu trono, e a terra [é] o estrado dos meus pés; que casa vós construireis para mim?, diz o Senhor; ou Qual é o lugar do meu repouso?
50 Por acaso não [foi] minha mão [que] fez todas estas coisas?
51 Vós, obstinados e incircuncisos de coração e de ouvidos! Vós sempre resistis ao Espírito Santo! Tal como vossos pais [foram], assim também [sois] vós!
52 Qual dos profetas vossos pais não perseguiram? E eles mataram a todos os que anunciaram com antecedência a vinda do Justo, do qual agora vós tendes sido traidores e homicidas;
53 Que recebestes a Lei por ordem de anjos, e não [a] guardastes.
54 Eles, ao ouvirem estas coisas, retalharam-se de raiva em seus corações, e rangiam os dentes contra ele.
55 Mas ele, estando cheio do Espírito Santo, olhando firmemente para o céu, viu à glória de Deus, e a Jesus, que estava à direita de Deus.
56 E disse: Eis que vejo os céus abertos, e o Filho do homem, que está a direita de Deus!
57 Mas eles, clamando com alta voz, taparam seus próprios ouvidos, e correram juntos contra ele;
58 E, lançando [-o] fora da cidade, [o] apedrejaram; e as testemunhas puseram as roupas dele junto aos pés de um rapaz chamado Saulo.
59 E apedrejaram a Estêvão, que estava clamando e dizendo: Senhor Jesus, recebe o meu espírito.
60 E pondo-se de joelhos, clamou com alta voz: Senhor, não os culpes por este pecado. E tendo dito isto, morreu.




7.6 será peregrina... por quatrocentos anos. O relato paralelo de Gênesis explica o porquê destes 400 anos: “Sabes, de certo, que peregrina será a tua descendência em terra alheia, e será reduzida à escravidão, e será afligida por quatrocentos anos... e tornará para cá; porque a medida da injustiça dos amorreus [um dos clãs cananeus] não está ainda cheia” (Gn.15:13,16). Mesmo com o povo cananeu sendo tão ímpio e merecedor do juízo divino, Deus esperou pacientemente por quatrocentos anos, dando-lhes oportunidade de arrependimento, chance atrás de chance. E ele não ordenou ataque nenhum sem que antes a medida de iniquidade dos cananeus se enchesse, isto é, se tornasse tão grande que uma intervenção não seria apenas importante, mas obrigatória. A imoralidade, impiedade e desumanidade haviam atingido tão alto limite em Canaã, que não fazer nada a respeito seria uma omissão tão grande quanto se os Aliados não tivessem reagido à Hitler.

7.10 o livrou de todas as suas aflições. A linguagem aqui empregada é a mesma de Ap.3:10, que diz que Deus guardaria a igreja da Filadélfia da “hora da provação” (v. nota). Em ambos os casos, o meio que Deus usa para livrar ou guardar da adversidade não é tirando da terra, mas exercendo proteção em meio às tribulações terrenas. Deus livrou José das suas tribulações, no sentido de que José foi preservado em segurança espiritual e física, mas ele sofreu muito aqui na terra. Há muitos que querem somente a parte da honra que vem depois, mas se esquecem de tudo o que José sofreu injustamente no Egito: foi vendido como escravo por seus próprios irmãos que quase chegaram a matá-lo, depois foi preso após ter se mantido fiel em meio à tentação da esposa de seu patrão Potifar, e depois foi esquecido na cadeia pelo chefe dos copeiros, que tinha prometido se lembrar dele e libertá-lo. Em meio a tudo isso, Deus esteve com José, e José se manteve fiel a Deus. Isso é ser “livre de todas as suas aflições”, muito diferente de “não passar” por elas.

7.14 setenta e cinco. De acordo com a Septuaginta, e não pelo texto hebraico, que diz “setenta” (embora um rolo hebraico de Gênesis encontrado entre os manuscritos do mar Morto também liste “setenta e cinco”). A Septuaginta era a versão grega do AT, que foi usada pelo menos algumas vezes por Jesus e pelos apóstolos. Isso obviamente não significa que os cristãos considerassem todos os livros da Septuaginta como sendo canônicos, uma vez que a Septuaginta continha livros que não constam nem na Bíblia católica e nem na protestante, tais como o livro apócrifo de 1ª Esdras (=3ª Esdras na Vulgata), 3ª e 4ª Macabeus, o Salmo 151, os Odes de Salomão, a Oração de Manassés e os Salmos de Salomão. Os judeus nunca consideraram estes livros inspirados, mas tinham um cânon de 22 livros (equivalentes aos mesmos 39 livros da Bíblia protestante), como atesta Flávio Josefo em Contra Apião. Portanto, embora a Septuaginta fosse muito respeitada e famosa, ela não era um cânon próprio, mas apenas uma coleção de livros que incluía livros sagrados, mas não se limitava a eles. O “cânon alexandrino”, tão falado pelos papistas, não passa de lenda. Nunca na história antiga ou medieval alguém falou em “cânon alexandrino”. Fílon, o famoso judeu alexandrino da época de Jesus, jamais falou em “cânon alexandrino” e nem tampouco mencionou qualquer livro apócrifo da Septuaginta como sendo canônico ou inspirado. O próprio Senhor Jesus confirmou a validade do cânon judaico de 22 livros em Lc.11:51 (v. nota), cânon este seguido à risca pelos evangélicos e rejeitado pelos católicos, que seguem a lista de livros do Concílio de Trento (1545-1563), que em resposta à Reforma Protestante acrescentou sete livros a mais para dar sustento a algumas de suas inovações doutrinárias.

7.17 mas quando chegou perto o tempo da promessa. Satanás geralmente se levanta exatamente quando estamos próximos de receber as promessas de Deus e as respostas às nossas orações, dificultando a concretização das promessas e tentando colocar a semente da dúvida em nosso coração. Essa é outra razão pela qual é necessário que exerçamos perseverança incondicional na oração, sem jamais desistir de orar e de crer na realização do que foi posto na presença de Deus, “pois no tempo próprio colheremos, se não desanimarmos” (Gl.6:9).

7.22 Moisés foi instruído em toda a sabedoria dos egípcios. O lema popular de que “Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos”, é falso. Moisés, o escolhido por Deus para libertar Seu povo do Egito, foi instruído em toda a sabedoria dos egípcios, que eram o povo mais poderoso da época. Não havia quase ninguém no mundo antigo tão instruído e capacitado quanto Moisés. Semelhantemente, o apóstolo Paulo sabia pelo menos três idiomas, estudava amplamente a literatura sacra e pagã, era membro do sinédrio, demonstrava um amplo conhecimento das Escrituras do AT e refutava os líderes judaicos em suas próprias sinagogas. Por outro lado, os doze discípulos em geral eram meros pescadores sem instrução e sem nenhuma perspectiva de vida antes de Jesus os chamar. Portanto, um lema mais adequado e próximo da verdade é que “Deus escolhe quem ele quer, e quem ele escolhe ele capacita” – em vez de “Deus não escolhe os capacitados...”.

7.25 ele pensava que seus irmãos tivessem entendido que Deus ia lhes dar liberdade por meio da mão dele. O texto deixa claro que Moisés via a si mesmo como “libertador” naquela época, quando matou o egípcio. Ironicamente, quarenta anos mais tarde, quando foi chamado por Deus para de fato libertar os egípcios, ele não queria mais (Êx.4:13). Se alguma lição podemos tirar disso, é que Deus tem o tempo dele para tudo, e não cabe a nós apressarmos os planos de Deus por nossa própria conta, em vez de esperar no Senhor. Quando Moisés queria fazer as coisas por seu próprio braço, ele fracassou. Quando Moisés não queria mais, mas Deus o chamou, ele se tornou o libertador de Israel, o primeiro chefe dos hebreus. Quando tentamos fazer as coisas por conta própria, sem ser do momento e do desígnio de Deus, provavelmente fracassamos – e mesmo se tivermos uma vitória aparente, ela é muito menor do que a que Deus estava preparando para nós no tempo apropriado.

7.42 Deus... os entregou. V. nota em Rm.1:24.

7.44 segundo o modelo que tinha visto. O autor de Hebreus explica que esse tabernáculo terreno era uma cópia exata do tabernáculo que está no Céu (Hb.8:5).

7.48 não habita em templos feitos por mãos. Diferente do que muitos pensam, a adoração a Deus não se restringe a um templo físico. Os primeiros cristãos congregavam nas casas e no templo, e depois que foram proibidos de continuar se reunindo no templo passaram a congregar apenas em casas (v. nota em At.2:46). Atualmente, no entanto, há a falsa concepção de que para cultuar a Deus é necessária a figura do templo, como se o agir de Deus se restringisse a um local específico, condicionando Deus a um templo de pau e pedra. Por mais que alguns corram para o outro extremo, proibindo os templos, a visão pautada pela Bíblia não é nem aquela que proíbe os templos e nem a que torna Deus dependente dos templos, mas sim a que coloca a ênfase no coração do adorador (Jo.4:24). Se quem está adorando a Deus está adorando em sinceridade e de acordo com a verdade, Deus estará presente – independentemente se estão cultuando a Deus dentro ou fora de um templo, que em si mesmo não passa de um local para reunir pessoas.

7.51 sempre resistis ao Espírito Santo. É uma das provas bíblicas cabais de que é possível resistir a Deus, em contraste com a teologia calvinista da graça irresistível, que ensina que o homem não pode em hipótese alguma resistir.

7.52 mataram a todos os que anunciaram com antecedência a vinda do Justo. V. nota em Lc.11:51.

7.55 e a Jesus, que estava à direita de Deus. Estêvão não viu uma única pessoa, como afirmam os unicistas, que creem que Jesus e o Pai são a mesma pessoa, mas sim duas, o que prova que Jesus é uma pessoa distinta do Pai (v. também Mc.14:62).

7.59 recebe o meu espírito. O espírito, no conceito holista bíblico, não é uma “alma imortal”, como no conceito grego platônico, mas o fôlego de vida presente em todos os seres humanos, que Deus soprou originalmente sobre Adão por ocasião da criação do homem (Gn.2:7) e que retorna para Ele após a morte (Ec.12:7). Este sopro de vida é o que concede animação ao corpo, isto é, que o possibilita a continuar ativo, como uma “alma vivente” (Gn.2:7). Este espírito (fôlego de vida) está presente tanto em homens como em animais (Gn.7:15; 6:17; 7:21-22). Salomão diz que homens e animais “têm o mesmo espírito (ruach)” e que por isso “todos vão para o mesmo lugar; todos foram feitos do pó, e todos voltarão ao pó” (Ec.3:19-20). A diferença é que para os homens ainda há a ressurreição na volta de Jesus, fazendo da morte um fim temporário, enquanto para os animais a morte é um fim permanente.  

7.60 tendo dito isto, morreu. Literalmente, o texto diz koimao, que significa “adormeceu”. Sobre o eufemismo do “dormir” para a morte, v. nota em Jo.11:11. 

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