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Este capítulo faz parte da obra: “Exegese de Textos Difíceis da Bíblia”, ainda em construção.
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Mais uma doutrina polêmica, que divide opiniões, é a do “batismo pelos mortos”, praticado pelos mórmons. A referência bíblica a este conceito se encontra em apenas um único texto bíblico, que diz:
“Se não há ressurreição, que farão aqueles que se batizam pelos mortos? Se absolutamente os mortos não ressuscitam, por que se batizam por eles?” (1ª Coríntios 15:29)
Com base nisso, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias decidiu que era certo se batizar no lugar de alguém que já morreu sem o batismo. Em outras palavras, como o batismo seria teoricamente necessário para a salvação, e alguma pessoa morreu sem ser batizada, então um crente vivo se batiza no lugar dela, e desta forma a pessoa que morreu pode ser salva. No entanto, a expressão “batismo pelos mortos”, em si mesma, permite múltiplas interpretações diferentes, e é apenas o contexto que pode nos ajudar a definir qual interpretação é a mais provável.
Linha 1
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Linha 2
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Batismo na esperança de rever os mortos
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Batismo no lugar de alguém que já morreu
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Há pelo menos três problemas cruciais com a Linha 2, adotada pelos mórmons. Em primeiro lugar, não há nenhuma evidência histórica de cristãos em qualquer era que praticassem um “batismo pelos mortos” no sentido mórmon do termo. A única evidência histórica de alguém que praticou isso foi Marcião, um herege gnóstico do século II, que foi muito combatido pelos crentes da época. O herege Marcião distorceu o significado de “batismo pelos mortos” igual Joseph Smith faria mais de um milênio depois.
Em segundo lugar, a Linha 2 atropela sem piedade o conceito bíblico de que a esperança de salvação para uma pessoa se limita apenas a esta presente vida (Hb.3:13; 2Co.6:1-2), e que depois da morte vem imediatamente o juízo da segunda vinda de Cristo (Hb.9:27), definindo inexoravelmente o destino final de salvos ou condenados. A Bíblia é clara ao dizer que “cada um prestará contas de si mesmo a Deus” (Rm.14:12), indicando assim que o que será julgado no dia do Juízo não serão as práticas de alguma outra pessoa em nosso favor, mas apenas as nossas próprias. Ou nós vivemos uma fé que produz obras e que gera a salvação, ou nós estaremos eternamente condenados. Não existe chance de salvação depois da morte, como o batismo mórmon faz supor.
Em terceiro lugar, a Linha 2, assim como outras linhas de interpretação que tem sido propostas pelos teólogos através dos séculos, fracassa miseravelmente na análise do contexto, que é a única coisa que neste caso particular pode nos ajudar a precisar o significado do texto em pauta. Por mais que a expressão em si – “batismo pelos mortos” – possa ser interpretada de muitas maneiras diferentes, o contexto como um todo só admite uma. Basta ver aquilo que Paulo argumentava desde o início do capítulo 15, que o sentido torna-se claro. O grande problema na comunidade de Corinto é que havia “crentes” ali que não criam na ressurreição dos mortos (v.12). Ou eles pensavam que a morte era a cessação de existência para sempre (como os epicureus), ou eles pensavam que quem morria sobreviveria em forma de espírito ou alma incorpórea consciente (como os platônicos).
Paulo então começa a rebater a crendice de que não há ressurreição. Ele começa argumentando que, se não há ressurreição dos mortos, então nem Cristo ressuscitou (v.13), e os apóstolos seriam falsas testemunhas da ressurreição de Jesus (v.15). Se não há ressurreição, então nem Cristo ressuscitou, e neste caso os que já morreram estão “perdidos”, ou “pereceram” (v.18). Ainda neste caso, a nossa esperança se limitaria apenas a esta presente vida, pois não existiria uma vida póstuma em algum lugar (v.19). Então Paulo apresenta a realidade da esperança da vida futura, que consiste na expectativa de ressuscitar na volta de Cristo (vs.22-23), sendo vivificado por ele para uma vida eterna.
Depois disso, ele decide ampliar as consequencias daquilo que seria caso realmente os mortos não ressuscitassem jamais. Além da questão do batismo pelos mortos, ele diz também que nós estaríamos sofrendo perigos o tempo todo à toa (v.30), ou seja, sem razão, inutilmente. Uma vez que não existiria ressurreição no futuro para desfrutar de uma vida eterna com Deus, qualquer perigo que Paulo passasse para pregar o evangelho (e ele sofria como ninguém!) seria inócuo. No verso 32 ele complementa o pensamento, dizendo:
“Se foi por meras razões humanas que lutei com feras em Éfeso, que ganhei com isso? Se os mortos não ressuscitam, ‘comamos e bebamos, porque amanhã morreremos’” (1ª Coríntios 15:32)
Se não existisse ressurreição no futuro, então Paulo teria “lutado com feras” em Éfeso sem ganhar nada com isso, porque a morte seria a cessação total de existência para sempre, e não apenas uma cessação temporária de existência, como é no caso de haver ressurreição póstuma. Na segunda parte do verso ele completa este pensamento: se os mortos não vão ressuscitar, então vamos viver uma vida hedonista e mundana, que consiste em “comer, beber e depois morrer”. A vida após a morte, para Paulo, se dava na ressurreição. Por isso, se ela não existisse, esta vida presente seria a única que existiria, e neste caso qualquer coisa que se fizesse pelo evangelho seria em vão. Era essa toda a lógica do apóstolo, a tônica principal de 1ª Coríntios 15.
Tendo entendido o contexto, voltemos para o texto em discussão, e vejamos como o sentido se torna muito mais claro:
“Se não há ressurreição, que farão aqueles que se batizam pelos mortos? Se absolutamente os mortos não ressuscitam, por que se batizam por eles?” (1ª Coríntios 15:29)
Pelo contexto, Paulo não estava falando nada sobre o que se deve fazer ou não por quem já morreu. Pelo contexto, Paulo também não estava falando nada sobre a importância do batismo na fé cristã, como outros teólogos supõem. O batismo era só um exemplo que caiu na ocasião para dentro de um pensamento maior, o qual era a inexistência de vida futura se não houvesse ressurreição. Os que se batizam pelos mortos são os que se batizavam na esperança de rever seus entes queridos que já haviam falecido. Na teologia paulina, o momento em que eles se encontrariam novamente com quem já morreu seria na ressurreição (veja 1Ts.4:13-18), mas se essa ressurreição não existe, então essa esperança era vã.
Consequentemente, os que se batizariam pelos mortos estariam se batizando por nada. Eles não iriam rever ninguém que já faleceu, porque, sem a ressurreição, os que já morreram pereceram para sempre. Cabe ressaltar que Paulo não estava dizendo que todos os cristãos se batizavam pelos mortos. A expressão “aqueles que se batizam” mostra que isso não era uma prática unânime. Nem todos os que vinham à fé cristã e se batizavam faziam isso porque esperavam encontrar novamente quem já morreu. No entanto, alguns faziam isso, e Paulo ressalta que estes que faziam isso estavam fazendo inutilmente se a ressurreição não existe.
Essa é a única interpretação que respeita o contexto geral de 1ª Coríntios 15. Todas as outras distorcem a Palavra de Deus (como a interpretação mórmon) ou colocam a ênfase no batismo em si, o qual já vimos que estava longe de ser a intenção de Paulo. Se você ler o texto tendo como foco o batismo em si, ele não fará sentido. O efeito que irá surtir será como se Paulo tivesse quebrado sua linha de pensamento, e depois a retomado mais tarde. Mas se o sentido do “batismo pelos mortos” for o proposto pela Linha 1, ele se encaixa perfeitamente bem em seu contexto geral, tendo em vista o que Paulo estava querendo provar, e onde ele queria chegar.
Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli (www.lucasbanzoli.com)
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