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Este capítulo faz parte da obra: “O Novo Testamento Comentado”, de autoria de Lucas Banzoli e de livre divulgação.
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1. E aconteceu que, quando Jesus tinha acabado todas estas palavras, disse a seus discípulos:
2. Vós bem sabeis que daqui a dois dias é a Páscoa, e o Filho do homem será entregue para ser crucificado.
3. Então os príncipes dos sacerdotes, e os escribas, e os anciãos do povo se reuniram na sala do sumo sacerdote, o qual se chamava Caifás.
4. E consultaram juntamente, para prenderem a Jesus com engano, e [o] matarem.
5. Porém diziam:
Não na festa, para que não haja tumulto entre o povo.
6. E estando Jesus em Betânia, em casa de Simão o leproso,
7. Veio a ele uma mulher com um vaso de alabastro, de óleo perfumado de grande preço, e derramou sobre cabeça dele, estando sentado [à mesa].
8. E seus discípulos, ao verem, indignaram-se, dizendo:
Para que [serve] este desperdício?
9. Porque este óleo perfumado podia ter sido vendido por muito, e o dinheiro dado aos pobres.
10. Porém Jesus, sabendo [disso], disse-lhes:
Por que perturbais a esta mulher? Pois ela me fez uma boa obra.
11. Pois vós sempre tendes aos pobres convosco, porém nem sempre tereis a mim.
12. Pois ela, ao derramar este óleo perfumado sobre meu corpo, ela o fez para [preparar] o meu sepultamento.
13. Em verdade vos digo que onde quer que este Evangelho em todo o mundo for pregado, também o que esta fez será dito para sua memória.
14. Então um dos doze, chamado Judas Iscariotes, foi aos chefes dos sacerdotes,
15. E disse:
O que quereis me dar, para que eu o entregue a vós?
E eles lhe determinaram trinta [moedas] de prata;
16. E desde então buscava oportunidade para o entregar.
17. E ao primeiro [dia da festa] dos [pães] sem fermento, vieram os discípulos a Jesus, dizendo-lhe: Onde queres que te preparemos, para comer a Páscoa?
18. E ele disse:
Ide à cidade um tal, e dizei-lhe:
O Mestre diz:
Meu tempo está perto; contigo farei a Páscoa com meus discípulos.
19. E os discípulos fizeram como Jesus lhes mandara, e prepararam a Páscoa.
20. E vinda a tarde, sentou-se [à mesa] com os doze.
21. E comendo eles, disse:
Em verdade vos digo, que um de vós me trairá.
22. E eles, entristecendo-se em grande maneira, cada um deles começou a lhe dizer:
Por acaso sou eu, Senhor?
23. E respondendo ele, disse:
O que comigo mete a mão no prato, esse me trairá.
24. Em verdade o Filho do homem vai, como dele escrito está; mas ai daquele homem, por quem o Filho do homem é traído; bom lhe fora ao tal homem, se não houvesse nascido.
25. E respondendo Judas, o que o traía, disse:
Por acaso sou eu, Rabi?
Ele lhe disse:
Tu o disseste.
26. E enquanto eles comiam, Jesus tomou o pão, e bendizendo partiu-o; e o deu aos discípulos, e disse:
Tomai, comei, isto é o meu corpo.
27. E tomando o copo, e dando graças, deu-o a eles, dizendo:
Bebei dele todos,
28. Porque este é o meu sangue do novo testamento, o qual é derramado por muitos, para perdão de pecados.
29. E eu vos digo que desde agora não beberei deste fruto da vide, até aquele dia, quando o beber novo convosco no reino de meu Pai.
30. E havendo cantado um hino, saíram para o monte das Oliveiras.
31. Então Jesus lhes disse:
Todos vós vos ofendereis em mim esta noite; porque está escrito:
Ferirei ao pastor, e as ovelhas do rebanho serão dispersas.
32. Mas depois de eu haver ressuscitado, irei adiante de vós para a Galileia.
33. Porém respondendo Pedro, disse-lhe:
Ainda que todos se ofendam em ti, eu nunca me ofenderei.
34. Disse-lhe Jesus:
Em verdade te digo, que nesta mesma noite, antes que o galo cante, me negarás três vezes.
35. Pedro lhe disse:
Ainda que me seja necessário contigo morrer, em maneira nenhuma te negarei. E todos os discípulos disseram o mesmo.
36. Então Jesus veio com eles a um lugar chamado Getsêmani, e disse aos discípulos:
Sentai-vos aqui, até que eu vá, e ali ore.
37. E tomando consigo a Pedro, e aos dois filhos de Zebedeu, começou a se entristecer e a se angustiar em grande maneira.
38. Então lhes disse:
Minha alma está totalmente triste até a morte; ficai aqui, e vigiai comigo.
39. E indo um pouco mais adiante, prostrou-se sobre seu rosto, orando, e dizendo:
Pai meu, se é possível, passe de mim este cálice; porém, não [seja] como eu quero, mas sim como tu [queres].
40. E ele veio a seus discípulos, e os achou dormindo; e disse a Pedro:
Então nem uma hora pudestes vigiar comigo?
41. Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito em verdade [está] pronto, mas a carne [é] fraca.
42. Voltando pela segunda vez, orou, dizendo:
Pai meu, se não pode este cálice passar de mim, sem que eu o beba, faça-se a tua vontade.
43. E vindo [a eles], achou-os outra vez dormindo, porque seus olhos estavam pesados.
44. E deixando-os, voltou e orou pela terceira vez, dizendo as mesmas palavras.
45. Então veio a seus discípulos, e disse-lhes:
Dormi já e descansai; eis que chegada é a hora que o Filho do homem é entregue em mãos de pecadores.
46. Levantai-vos, vamos, eis que chegado é o que me trai.
47. E falando ele ainda, eis que vem Judas, um dos doze, e com ele uma grande multidão, com espadas e bastões, [da parte] dos príncipes dos sacerdotes, e dos anciãos do povo.
48. E o que o traia, lhes tinha dado sinal, dizendo:
Ao que eu beijar, esse é, prendei-o.
49. E logo chegando a Jesus, disse:
Alegra-te, Rabi!
e o beijou.
50. Porém Jesus lhe disse:
Amigo, para que vens aqui?
Então chegaram, e lançaram mão de Jesus, e o prenderam.
51. E eis que um dos que [estavam] com Jesus, estendendo a mão, puxou de sua espada, e ferindo ao servo do sumo sacerdote, cortou-lhe uma orelha.
52. Então Jesus lhe disse:
Volta tua espada a seu lugar; porque todos os que tomarem espada, à espada perecerão.
53. Ou pensas tu, que não possa eu agora orar a meu Pai, e ele me daria mais de doze legiões de anjos?
54. Como pois se cumpririam as Escrituras, [que dizem], que assim convém que se faça?
55. Naquela mesma hora disse Jesus às multidões:
Como a ladrão saístes com espadas e bastões para me prender; todo dia me sentava convosco, ensinando no Templo, e não me prendestes.
56. Mas tudo isto se fez, para que as Escrituras dos Profetas se cumpram. Então todos os discípulos fugiram, deixando a ele.
57. E os que prenderam a Jesus, trouxeram[-lhe] a Caifás, o sumo sacerdote, onde os escribas e os anciãos estavam reunidos.
58. E Pedro o seguia de longe, até a sala do sumo sacerdote; e entrando dentro, sentou-se com os servos, para ver o fim.
59. E os chefes dos sacerdotes, e os anciãos, e todo o conselho, buscavam [algum] falso testemunho contra Jesus, para poderem matá-lo, e não achavam.
60. E ainda que muitas falsas testemunhas se apresentavam, [contudo] não achavam.
61. Mas por fim vieram duas falsas testemunhas, e disseram:
Este disse:
Eu posso derrubar o Templo de Deus, e edificá-lo em três dias.
62. E levantando-se o sumo sacerdote, disse-lhe:
Não respondes nada? O que estes testemunham contra ti?
63. Porém Jesus ficava calado. E respondendo o sumo sacerdote, disse-lhe:
Ordeno-te pelo Deus vivente, que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus.
64. Jesus lhe disse:
Tu o disseste. Porém eu vos digo que, desde agora, vereis ao Filho do homem, sentado à direita do poder [de Deus], e vindo nas nuvens do céu.
65. Então o sumo sacerdote rasgou suas roupas, dizendo:
Blasfemou, para que mais necessitamos de testemunhas? Eis que agora ouvistes sua blasfêmia.
66. Que vos parece?
E respondendo eles, disseram:
Culpado é de morte.
67. Então lhe cuspiram no rosto, e lhe deram socos.
68. E outros lhe davam de bofetadas, dizendo:
Profetiza-nos, ó Cristo, quem é o que te feriu?
69. E Pedro estava sentado fora na sala; e chegou-se a ele uma serva, dizendo:
Também tu estavas com Jesus o galileu.
70. Mas ele o negou diante de todos, dizendo:
Não sei o que dizes.
71. E tendo ele saído à anteporta, outra o viu, e disse aos que ali [estavam]:
Também este estava com Jesus o nazareno.
72. E ele o negou outra vez com juramento, [dizendo]:
Não conheço a [esse] homem.
73. E pouco depois, chegando os que ali estavam, disseram a Pedro:
Verdadeiramente também tu és um deles, porque tua fala te revela.
74. Então começou ele a amaldiçoar, e a jurar, [dizendo]:
Não conheço a [esse] homem!
75. E logo o galo cantou. E lembrou-se Pedro da palavra de Jesus, que lhe dissera:
Antes que o galo cante, me negarás três vezes.
E indo para fora [dali], chorou amargamente.
26.8 seus discípulos. João é mais específico ao dizer que este discípulo era Judas Iscariotes (Jo.12:4-6). Segundo nos informa João, “ele [Judas] disse isto, não pelo cuidado que tivesse dos pobres, mas porque era ladrão e tinha a bolsa, e tirava o que ali se lançava” (Jo.12:6).
26.11 sempre tendes aos pobres convosco. Jesus não estava desprezando os pobres, pois ele mesmo disse que dos pobres é o Reino dos céus (Lc.6:20), afirmou que seu ministério era de “pregar boas novas aos pobres” (Lc.4:18), pediu para aquele jovem rico vender tudo e dar aos pobres (Mt.19:21), elogiou a viúva pobre das duas moedinhas (Lc.21:2) e Zaqueu por ter dado metade dos seus bens aos pobres (Lc.19:8), e seus discípulos tinham uma bolsa de onde tiravam dinheiro para dar aos pobres (Jo.13:29). A mensagem principal não era que devemos negligenciar os pobres, mas que Jesus é ainda mais importante, e que ele não estaria por muito tempo fisicamente com eles, pois já estava em seus últimos dias na terra – e os discípulos ainda teriam toda a vida para fazer doações aos pobres.
26.15 trinta moedas de prata. Era o equivalente a 120 denários, sendo que um denário era o que o trabalhador recebia por um dia de trabalho. Judas, portanto, recebeu o equivalente a 4 meses de trabalho somente por entregar Jesus.
26.24 o Filho do homem vai, como dele escrito está. Este versículo pode fazer parecer que Judas era “obrigado” a trair Jesus, como se não houvesse nenhuma possibilidade de não traí-lo, pois isso já estava escrito acerca dele. Se isso fosse verdade, Judas não seria o responsável moral por seus atos, se eles já estavam predeterminados e não havia nada que ele pudesse fazer para não cometê-los. Mas quando pensamos dentro do prisma da presciência não-causativa de Deus, vemos que Deus previu, desde a eternidade, que Judas trairia Jesus livremente, por livre e espontânea vontade. Judas poderia não ter traído Jesus (e neste caso as profecias acerca dele seriam diferentes), mas Deus sabia que ele pecaria livremente, ou seja, que ele escolheria trair. O ato livre e a decisão espontânea que Judas tomou foram previstos por Deus, de modo que a tradição pôde ser profetizada e depois concretizada.
Então, temos o seguinte quadro:
• Judas é um homem livre. Ele pode escolher trair ou não trair Jesus.
• Judas livremente decide que vai trair Jesus.
• Deus antevê, por sua presciência, que Judas trairia, porque Judas, no futuro, decidiu isso livremente.
• Então, Deus profetiza desde o passado que um dos discípulos trairia Jesus, e o próprio Jesus confirma isso.
Como vemos, o ato de Judas foi autodeterminado, e não determinado por Deus. O fato de Deus prever o evento não o torna o causador do evento. Quem causou, quem era o responsável e quem poderia ter agido diferente da forma que agiu foi o próprio Judas.
26.26 isto é o meu corpo. V. nota em Mc.14:22.
26.30 havendo cantado um hino. O louvor faz parte importante da liturgia cristã. Paulo nos pede para “falar entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de coração ao Senhor” (Ef.5:19). Todo louvor deve ser para a honra e glória de Deus (1Tm.1:17), como adoração ao Senhor, com ênfase Cristocêntrica, e não antropocêntrica. Em nossos dias, muitas músicas “gospel” servem apenas para o louvor de si mesmo ou a glorificação da própria “vitória” ou do “milagre” recebido, e não de Deus. É a Deus que louvamos, e não a nós mesmos, às nossas vitórias ou adversidades. Qualquer louvor que não tenha como foco principal na letra a glória a Deus não é louvor, mas somente música. Como os serafins, o foco deve ser sempre que “santo, santo, santo é o Senhor dos Exércitos, a terra inteira está cheia da sua glória” (Is.6:3).
26.35 de maneira nenhuma te negarei. Nesta época Pedro já mostrava grande confiança, mas ainda tinha pouca maturidade. Disse que seria o único que não negaria Jesus, e foi o único que o negou. A história iria mostrar um Pedro arrependido e mais maduro, que no fim da vida se redimiria deste erro e seria martirizado por amor a Jesus, sendo crucificado de cabeça para baixo, por não se julgar digno de morrer da mesma maneira que seu Mestre.
26.38 vigiai comigo. Cristo naquele momento queria intercessores que aliviassem o peso sobre sua alma, mas só encontrou dorminhocos (v.40-45).
26.39 se é possível. Não que isso não fosse possível para Deus, mas no sentido de que o desejo de não passar pela cruz poderia não estar de acordo com a vontade dEle (v.42). Seria como sugerir um “plano B” que não envolvesse a morte com tanto sofrimento – embora ele soubesse que isso poderia confrontar a vontade do Pai, que é a que ele queria que fosse feita, sujeitando-se a Ele. Jesus passou por esse conflito interno como homem, assim como muitos de nós passamos, quando queremos algo que Deus não quer. Devemos, acima de tudo, fazer como Jesus e sujeitar a nossa vontade à vontade de Deus, que é maior, que é soberana e que é melhor para nós, no plano espiritual.
26.41 vigiai e orai, para que não entreis em tentação. Orar e guardar prontidão contra as formas do mal é o caminho para se vencer as tentações. Paulo fala sobre isso com mais profundidade em Romanos 7:15-25 (v. nota).
26.41 o espírito está pronto, mas a carne é fraca. Interiormente, Jesus estava decidido que devia morrer na cruz, bebendo o “cálice” (v.42) que o Pai preparou. Mas, humanamente falando (pela carne), temia o sofrimento, como qualquer ser humano que está prestes a ser torturado e morto. Isso mostra de forma clara o lado humano de Jesus, contra a tese daqueles que afirmam que Jesus não sentiu dor, por ser Deus. O sacrifício de Cristo foi louvável porque foi real – não uma encenação teatral. As dores causadas em Jesus com a traição, a zombaria, as bofetadas, a coroa de espinhos, as 39 chibatadas com o flagelo romano (o instrumento mais brutal e terrível de punição utilizado pelo império romano), a cruz pesada carregada em suas costas, os pregos em seus pulsos e o prego em seus pés foram sentidos tão fortemente por Cristo quanto seria com qualquer um de nós.
26.51 um dos que estavam com Jesus. João diz que foi Pedro (Jo.18:10).
26.52 porque todos os que tomarem espada, à espada morrerão. Foi por ignorar essas palavras de Cristo que a Igreja papal medieval lançou mão da espada nas cruzadas e de instrumentos de tortura e morte na inquisição. Os verdadeiros cristãos (os dos primeiros séculos) eram perseguidos e mortos à espada pelos romanos, sem esboçarem qualquer reação e aceitando o martírio de bom grado, enquanto os falsos cristãos da Idade Média tomaram o lugar dos romanos e inverteram os papeis, se tornaram os opressores, ao invés dos oprimidos.
26.61 eu posso derrubar o templo de Deus. Jesus não havia dito que ele derrubaria o templo, mas que o templo seria derrubado (Jo.2:19). Portanto, aquelas falsas testemunhas estavam distorcendo deliberadamente as palavras de Cristo, como se ele estivesse dizendo que ele próprio derrubaria o templo, o que não é verdade.
26.65 rasgou suas roupas. O sumo sacerdote era proibido de rasgar suas vestes, sob a pena de perder o sacerdócio pela morte (Lv.10:6). Alguns veem aqui um cumprimento profético disso, com Caifás sendo destituído da autoridade sacerdotal por Deus, e Jesus sendo espiritualmente colocado como o sumo sacerdote no lugar dele (Hb.10:21).
26.73 tua fala te revela. Assim como um paulista reconheceria um baiano pelo sotaque baiano, ou um gaúcho pelo sotaque gaúcho, era fácil identificar um galileu pelo seu sotaque.
26.74 começou ele a amaldiçoar, e a jurar. Pedro, ao ver que não estava sendo suficientemente convincente, preferiu apelar para juramentos e a se amaldiçoar, que eram coisas que os judeus levavam tão a sério que poderia colocar um ponto final na discussão.
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